Nossa próxima missão é buscar entender como os hábitos funcionam. Para isso, vamos recuar até 1992 na Califórnia, nos EUA, e conhecer a impressionante história de Eugene Pauly. Tudo começou quando Beverly, mulher de Eugene, preparava o jantar, e disse ao marido que, Michael, filho do casal, iria visitá-los. "Quem é Michael?", ele perguntou.
Em um primeiro momento, ela achou que o marido estivesse brincando, mas Eugene a olhou com uma expressão vazia, antes de insistir: "De quem você está falando?"
No dia seguinte, Eugene foi hospitalizado com vômitos, febre e cólicas. Um exame indicou que ele estava com encefalite viral, doença que em casos raros provoca graves lesões no cérebro e destrói o tecido onde ficam armazenados pensamentos e sonhos. O paciente ficou dez dias em coma, até que um tratamento surtisse efeito. Tomografias indicaram que uma área do cérebro havia sido consumida. Alertaram Beverly que seu marido talvez nunca voltasse a ser como antes.
Poucas semanas depois, porém, Eugene já andava e conversava, surpreendendo a todos. Contudo, Beverly notou que a memória do marido havia sido alterada. No retorno para casa, ele não lembrava os nomes de amigos. Pela manhã, saia da cama, ia até a cozinha e preparava bacon com ovos. Depois voltava a se deitar e ligava o rádio. Após 40 minutos, voltava ao fogão, fazia mais bacon com ovos, antes de retornar ao quarto e novamente ligar o rádio. Após algum tempo, repetia todo o processo.
Assustada, Beverly procurou ajuda e chegou a Larry Squire, pesquisador especializado em perda de memória. Ao perguntarem a Eugene qual era a sua idade, ele disse, em dúvida: "tenho 59 ou 60?". Porém, já tinha completado 71 anos. Squire tinha experiência no estudo de como o cérebro armazena acontecimentos, mas com aquele paciente ele descobriria que mesmo alguém sem lembranças recentes pode desenvolver hábitos complexos.
Eugene tinha recordações do que havia ocorrido até 1960, mas as três décadas seguintes desapareceram da mente dele. Se alguém mostrasse fotos de seus netos, por exemplo, ele não fazia ideia de quem eram. Era incapaz até mesmo de desenhar um mapa básico e indicar onde ficava a cozinha ou o quarto em sua casa.
Por recomendação médica, Beverly saia com o marido para uma volta diária pelo quarteirão. Sempre de olho nele, ela temia que caso Eugene se perdesse nunca mais achasse o caminho para casa. Uma manhã, sem que ela notasse, o marido saiu de casa. Quando percebeu a falta dele, Beverly saiu pelas ruas, mas não o encontrou. Após algum tempo, voltou para casa a fim de ligar para a polícia. Ao entrar, viu Eugene sentado, assistindo TV. Ele tinha retornado sozinho. Alguns dias depois, o marido já saía para caminhar todas as manhãs pelo bairro.
Cientes disso, os médicos fizeram alguns experimentos. Pediram que Eugene desenhasse um mapa do quarteirão onde morava, mas ele não conseguiu. Sequer era capaz de lhes dizer qual das portas de sua casa dava para a cozinha. "Mas e se você sentir fome?", perguntaram. Eugene levantou, foi à cozinha, abriu um armário e voltou com um pote de amendoins.
Acompanhado por um pesquisador em sua caminhada, o homem sem memória andou por 15 minutos, sem pedir informações, mas parecendo saber o trajeto correto. Já perto de casa, foi questionado: "onde você mora?". Eugene disse que não sabia. Porém, seguiu por sua calçada, abriu a porta, entrou e ligou a TV.
Estava claro que o ele vinha absorvendo novas informações. Mas como? Experimentos sobre hábitos feitos com ratos revelaram que áreas cerebrais eram ativadas quando eles eram testados para ouvirem um clique, seguirem por um labirinto até encontrarem chocolate. Após algumas semanas, à medida que os animais iam se acostumando com a tarefa, o cérebro convertia uma sequência de ações numa rotina automática.
A mesma coisa ocorre conosco. Há dezenas ou centenas de comportamentos dos quais dependemos diariamente, sejam eles simples, como abrir a torneira para lavar as mãos, ou mais complexos, como cozinhar. Outros são bem mais complicados, como tirar um carro da garagem em marcha à ré. Mas fazemos isso quase sem pensar.
Faça um teste: pare e pense sobre quantos hábitos diários você repete sem que se dê conta. Anote alguns deles e analise a complexidade de cada um dos atos em sua rotina.
Hábitos surgem porque o cérebro busca formas de poupar esforço. Caso seja deixada por conta própria, nossa mente tentará transformar quase qualquer rotina em um hábito. Tal instinto sempre foi uma enorme vantagem evolutiva. Porém, o cérebro desenvolveu um sistema inteligente para determinar quando um hábito deve assumir o comando sem que este modo automático ofereça riscos.
Para entender como a mente decide que deve ceder o controle a um hábito é necessário compreender o loop de três estágios. Primeiro, há uma deixa, um estímulo que manda seu cérebro entrar no automático, também indicando que hábito ele deve usar. Depois, há a rotina, que pode ser física, mental e emocional. Por fim, existe a recompensa, que ajuda o cérebro a saber se vale a pena memorizar este loop específico para usos futuros.
Com o tempo, esse loop se torna cada vez mais automático. Assim, nasce um hábito. A descoberta do loop mostra que quando um hábito surge, o cérebro para de participar totalmente da tomada de decisões. A mente para de fazer tanto esforço ou desvia para outras tarefas. A não ser que você intencionalmente lute contra um hábito, ao buscar novas rotinas, o padrão irá ocorrer de forma automática. Porém, apenas entender como o loop funciona já permite controlar os hábitos mais facilmente.
Faça um teste: avalie o loop dos hábitos presentes em seu cotidiano. Estude qual é a deixa, a rotina e a recompensa que estão por trás de alguns dos seus hábitos.
Os hábitos nunca desaparecem, ficam codificados nas estruturas cerebrais. Isso é uma vantagem, do contrário teríamos que reaprender a dirigir, por exemplo, cada vez que ficássemos algum tempo longe do volante. O problema é que o nosso cérebro não diferencia hábitos bons dos ruins.
Com isso, caso você tenha um hábito nocivo, saiba que ele sempre estará ali, meio escondido, apenas esperando as deixas e recompensas que o ressuscite. Porém, se aprendermos a criar novas regras rotinas neurológicas que se mostrem mais fortes do que tais comportamentos podemos conseguir com que tendência ruins fiquem de lado.
Faça um teste: dentre seus hábitos, quais você considera que são nocivos? Que novas regras você poderia criar para fazer com que tais hábitos fiquem em segundo plano?
De volta a Eugene, os pesquisadores desconfiaram que ele pudesse estar aprendendo comportamentos novos por usar o loop do hábito, apesar de sua lesão cerebral. Novos testes indicaram que a suspeita estava correta. Embora não se lembrasse de fato de coisas recentes, ele era capaz de realizar padrões em testes com o loop, ou seja, de adquirir novos hábitos. Isso explicava como ele conseguia sair diariamente para caminhar e voltar para casa muito embora fosse incapaz de reconhecer sua própria casa.
Os experimentos de Squire com Eugene mostraram que hábitos, tanto como a memória e a razão, são a raiz do nosso comportamento. Talvez não nos lembremos das experiências que criam nossos hábitos. Mas, uma vez que estão armazenados em nossas mentes, eles influenciam a forma como atuamos, muitas vezes de modo imperceptível.
Muitas pesquisas depois das descobertas de Squire com Eugene têm revelado muito sobre os hábitos. Eles são poderosos, mas delicados. Podem surgir de fora de nossa consciência ou coordenados intencionalmente. São tão fortes que fazem com que nos apeguemos a eles com prejuízo de todo o resto, inclusive do bom-senso.
Em 2008, Eugene sofreu um ataque do coração fatal. O homem sem memória seria celebrado por sua contribuição à ciência, embora nunca tivesse se lembrado disso em vida.
Faça um teste: dentre os hábitos que você já identificou no seu dia a dia, quais você diria que são intencionais? Você consegue indicar quais são os hábitos mais fortes na sua vida?
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